quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

13 fatos sobre 2mil&13

minha coluna de fim de ano do ornitorrinco:


1. Tenho pensado muito na permanência. No estado e na sensação. Fim de ano me melancoliza. E parei de culpar o inferno astral. É a cidade mesmo, o país, o universo. Não tenho casa para morar ano que vem e tudo que vejo custa um preço que me faz arrotar. Hei de conseguir. E mesmo que não permaneça, hei de descobrir outro estado, outra sensação.

2. Fui fazer um retiro de 5 dias na serra. Não tem linha. Podia falar, podia comer, podia tudo, só chamo de retiro pois assim encarei. Meditar não é só sentar de pernas cruzadas. Respeito os retiros com nomes de retiros e regras de retiro, mas meu mapa astral não me permite lugares assim. O que tiver de vir, virá. De dentro, de dentro. Nós, mulheres, somos grandes bonecas russas. E se eu paro pra pensar na mãe da mãe da mãe da mãe da mãe da minha mãe, nem posso. Já choro.

3. Eu estou viva. 2mil&13 me matou um bocadinho. Geralmente os ímpares me matam, nos anos pares eu colho. Parece coincidência, mas não é. Os ímpares matam (morrer é importante, deus me livre ser highlander) os pares acompanham, te dão suporte.

4. A escolha (mentira, não é uma escolha) em ser artista me obriga, de alguma maneira, a permanecer em algum grande centro urbano, embora isso me exaspere. Foi o ano em que mais odiei o Rio, mesmo morando brevemente perto da praia. Essa foi minha terapia, o mar. Mergulhei muito esse ano, nadei um bocado. Foi meu único amor com a cidade, o mar. Porque de resto foi só decepção e medo. Preciso mesmo estar aqui sendo artista? Se eu me encalacrar no mato, vão parar de me chamar para as coisas? É o que dizem, eu não sei, sinceramente. Estou aqui, mas não estou aqui, então do quê adianta?

5. Pessoas que dizem "sonhei com você" estão mentindo. Passaram a noite pensando em você, mas a etiqueta encalacrada das pessoas cagonas que não querem se expor não permite isso. Então, as pessoas apelam para o subconsciente e mandam mensagens dizendo que "sonharam com você". Mentira. Passaram a noite pensando em você. Acordadíssimos. Que em 2014, as pessoas tenham mais coragem de dizer "eu passei a noite pensando em você", isso não te torna carente ou devotado demais ou sei lá o quê, isso te torna humano. Isso te torna amor.

6. Terminar uma relação é porrada. O ouvido apita um "i" agudo sem parar. O chão abre, a sua comida favorita não tem gosto, o álcool desce como água. Você lembra dos planos que ficaram no coração, dos filhos que ficaram no saco escrotal, nas viagens que não rolaram, você pensa nos seus pais, você se frustra, você esperneia, você implora, você acha que é melhor assim mesmo, é montanha russa, mexicana, paraguaia, drama em vários atos, novela, horror. Mas...mas é inconcebível para mim, esfarelar o amor. Resumir ao pior. Não consigo. Se passei quase 6 anos amando um homem, não consigo sair da relação abraçada à frustração ou ao caos interno. Ou à raiva ou a qualquer outro sentimento de mágoa. Os amigos questionaram, ficou todo mundo espantado. Você está bem mesmo, Letícia? É óbvio que passei noites comendo cocô e ao invés de lavar o cabelo com shampoo caro eu só chorava embaixo do chuveiro. Perdão, toda água do mundo, compenso de outras maneiras. Mas eu tenho uma péssima tendência a ser feliz. Me perdoem, terapeutas, remédios, me perdoem. Que mania besta essa de querer rir, gargalhar, amar. E que memória absurda e companheira que só guarda os momentos astrais e de entrega absoluta e de fé e força. No amor. Lucas, sinto muito, me perdoe, te amo, sou grata. Feliz 2mil&14 pra você!

7. Parei de comer carne e frango. Nunca fui carnívora máxima, por enquanto estou gostando da limpeza. Pele, barriga, cara. Forte. Prometo não ficar chata com quem come. Tenho bons exemplos. Meu pai é churrasqueiro, minha mãe é yoga-linhaça-verduras. Ela prepara pra ele o filé mignon, mas não come. Mas ela prepara, entende? Feministas, eu também sou, mas eu agora estou falando de amor.

8. Fui muito reconhecida esse ano. Não passou uma semana sem que eu fosse abordada, na praia ou no mercado, na rua ou na manicure. A maneira sempre me surpreende, as pessoas tremem, contam de algum trecho da música que mandaram para o grande amor da vida delas, falam da sensação que tiveram no primeiro show. Sem contar nos emails que recebi. Carinhosos, meu deus, carinhosos, ursinhos. Eu respondi todos, tomara. O último foi um pouco mais triste. Moça contava que ela e o melhor amigo ouviam muito Letuce. Eram amigos, irmãos, brodismo alto. O rapaz se matou há pouco tempo, se jogou da janela, mas antes deu um sorrisinho pra ela. Ele era doutor em matemática. E gay. A moça me perguntava "Letícia, onde ele está agora?". Eu no meio do buffet, engasguei e respondi algo sobre luz, amor, interior, verdade. Foi difícil pra mim, imagina pra ela. Nem imaginem pra ele. Luz.

9. Minha voz. Esse ano passei horas sem falar, passei horas tagarelando, passei noites cantando. Minha voz era minha amiga, esse ano viramos amantes. Mas desses que se respeitam. Desses que não mentem. Quando vou maltratá-la em alguma madrugada sem destilados, eu aviso que vai doer um pouco essa bebida gelada, e assim temos nos relacionado bem. Fiz coisas que até então nunca tinha pensado. E não é que ela obedeceu ao desejo? Ela foi, ela conseguiu. Ô voz, que alegria profunda essa caverna corporal do eco.

10. Meus arrepios do ano vão para meus amigos. Não citarei nomes porque se esquecer algum, vou ficar chateada comigo mesma. Tenho uma facção, os mais presentes, claro, todos temos, mas esse ano fui agraciada por muitos. Amigos que vejo pouco, amigos que só bebo cerveja e falo besteiras, amigos que me dão divã, amigos de mergulhos, da literatura, da bicicleta, do camping, da feira, amigos que me dão casa pra ficar, amigos que me escrevem de longe qualquer besteira. Eu sempre tive muita sorte, mas esse ano eu confirmei. Que amor bonito esse. Esse encontro que beira a filosofia, o pum e o cocô, o abraço tímido e o porre escancarado, me emociona, bicho.

11. Gostei bem de escrever para o Ornitorrinco, não me acho boa escritora, mas sinto prazer quando junto as letras, os verbos, as palavras, e sentir prazer já é meio caminho andando, então me diverti, foi quase terapia, foi importante demais. Gabriel, que bom aquele dia que você me chamou pra isso, que boa aquela hora que eu aceitei.

12. .

13. Jamais serei uma dessas pessoas que diz a frase "Você sabe com quem está falando?" Porque eu mesma não sei quem é essa que está falando. Esse ano fica como sendo o ano que entendi que vez ou outra, empresto o corpo para outras forças. E a voz também. Maravilha.

sábado, 14 de dezembro de 2013

domingo, 24 de novembro de 2013

luz

noites de especialidade:

quem sabe viver e empresta vida
alcança o reino do coração

eu agora entendi tudo
e abandono o nada

sábado, 9 de novembro de 2013

21 e 31 anos

madrugada:
analiso mapas
comparo luas
paro pra tapioca
paro pro gatorade
fosse ontem era vinho
hoje me recupero
fosse antigamente
eu já tava em outra
hoje tô de 4

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

ehr

é engraçado quando "as escravas atentas" me copiam, no modo de dizer, no jeito de escrever.
fosse antigamente ficava jogo-da-velha-chateada, hoje em dia me reafirmo abelha rainha. vanguarda, querida.

since feeling is first


e.e. cummings

since feeling is first
who pays any attention
to the syntax of things
will never wholly kiss you;
wholly to be a fool
while Spring is in the world

my blood approves,
and kisses are a better fate
than wisdom
lady i swear by all flowers. Don't cry
—the best gesture of my brain is less than
your eyelids' flutter which says

we are for each other: then
laugh, leaning back in my arms
for life's not a paragraph

And death i think is no parenthesis

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

último dia de agosto

auto centrada cambaleando na estrada
não há cinto que impeça
que meu coração tombe
que minha cabeça role
e que minha boceta sangre

eu hoje até teria um filho teu
meu ânimo respira com aparelhos
devo desligar e sorrir
só com a sobrancelha

esquecer os dentes
esquecer os dentes

sábado, 5 de outubro de 2013

Romance Ornamental

(Noite, rua, beira do mar, quiosque aberto, o único vendedor está vendo uma mini-tv. Sentados nas cadeiras, embaixo de um guarda-chuva gigante, um homem e uma mulher. Chove. Eles não se importam, duas águas de coco já foram tomadas, estão vendo os raios caindo no mar, não falam há 17 minutos. Até que.)


O: - Engraçado, eu pensava que poder era associado à maldade, eu não queria pensar isso, na real, mas pensava. Star Wars lascou minha cabeça.
A: - E depois Fausto?
O: - É, depois Fausto, depois O poderoso chefão, depois Nietzche, depois minha família, depois novelas, depois mulheres. Todos os poderosos são maus. Você não olha para o Dalai Lama e pensa "Que poder!"
A: - Eu penso! Porque o tipo de poder que eu desejo é o que ele tem: calma, tranquilidade.
O: - Mas você é um ET.
A: - Telefone minha casa
O: - Tem um guitarrista que fez pacto com o demônio para ser o melhor guitarrista do mundo. 
A: - Por que não com Deus, né? 
O: - Com Deus é milagre. É o labirinto. Do bem, o curso da vida normal. Grande labirinto. Pacto é atalho. 
A: - Pacto é atalho! Eu nunca faria um pacto na minha vida.
O: - Você é muito boa.
A: - Eu sei, é horrível.
O: - Não, é lindo. Eu nunca tinha conhecido alguém bom e forte. Eu achava que pra ser forte a gente tinha que ser mau. A gente tinha que ir para o dark side.
A: - Luke, I am your father.
O: - Têm vários filmes que o vilão vence.
A: - É cinema!
O: - Mas na filosofia tamb...
A: - Eu não sei, eu só leio romance.
O: - Vou te emprestar umas coisas.
A: - Eu te devolvo. Eu sou boa.
O: - (ri) Os vilões das novelas são sempre mais pops também.
A: - As rainhas más são mais curiosas que as princesas...
O: - O mundo pode ser inacreditável.
A: - Diz que a Xuxa fez pacto também para ela ser quem ela é.
O: - Nunca saberemos a verdade.
A: - Gosto de pensar que ela não fez, que ela é isso mesmo.
O: - Você é tão boazinha.
A: - Ela fez, né? Dizem que uma galera pesada aí do mundo das celebridades fez pacto. Eu até acredito em ritual. Em entrar no mar e conversar com as entidades, pedir agradecer, mas fazendo um pacto eu vou ter um preço a pagar, e sabe-se lá o que vai ser.
O: - No milagre, não há preço pelas benesses do bem, vale mais.
A: - Mas o milagre é loteria, né? O pacto é garantido? Como é? Você chama o Diabo? Liga pra ele? (gargalham)
O: - Diabooo, demônioooo...
A: - Ou você vai num lugar específico? E será que tem garantia mesmo assim? E o que ele leva de você em troca?
O: - Grande demência! Me irrita que as mulheres poderosas não são tão femininas, eu ia ach...
A: - Que caô! Várias mulheres poderosas femininas. Aquelas gurias do vôlei, super femininas, unha, cabelo, batom e com uma medalha de ouro no peito.
O: - Mas na política não rola tanto, a Dilma, Margaretch, Condoleezza, o poder pode ser meio brusco, não estou condenando, é inconsciente talvez, quanto mais demandas elas têm, mais ela podem se esquecer de algum contato íntimo pessoal...
A: - Mas são mulheres que correm com lobos. Não há escolha. Algumas mulheres escolhem ser outra coisa. Coisas que não são, coisas que desejam. Umas conseguem, outras ficam ridículas, pobrecitas. São apenas um simulacro do que almejam. Mas há uma parcela que não escolhe. Que é. Derruba tudo sendo. Mas é. Apesar d'eu ser boa, eu me encaixo nesse quesito. Seria bom tentar ser má. Mas quando eu vejo eu já tô devolvendo o troco que me deram errado.
O: - Ou ajudando as velhinhas do mercado que não alcançam as prateleiras do alto.
A: - Mesmo atrasada! Eu sou muito boa mesmo.
O: - Eu te contei que outro dia eu dei uma volta na lagoa e todas as pessoas que passaram por mim, todas, todas falavam de amor? De alguma maneira, um trecho que fosse.
A: - Que louco. Mash-up seleção natural da vida. Fazia sentido?
O: - Como?
A: - As frases! Uma mulher falava alguma coisa e a próxima pessoa que falava tinha a ver com a outra frase ouvida?
O: - Às vezes sim.
A: - Uau, místico. Tarô oral.
O: - Eu achei bem aleatório e bobo, meio ridículo.
A: - Por que? Eu ia ficar arrepiada.
O: - Porque me mostrou o quanto as pessoas são clichês, e as histórias de amor se repetem, não há ineditismo algum.
A: - É um cover do amor.
O: - Uma vez eu ouvi numa música "até o amor ser bom, ele é tão ruim"
A: - Que verdade terrível.


(silêncio de quase 1 minuto) 


A: - Sabe qual a distância desse raio?
O: - Como?
A: - Você ouve o trovão e começa a contar, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9! Ai quando o raio cai, você para a contagem! Nove! E sempre divide por três! Nove por três, três. Esse raio está a três quilômetros de distância.
O: - Olha!
A: - Mauricio de Souza que me ensinou.
O: - Uma dia você escreveu que eu era um raio, eu fiquei meio triste...
A: - Mas você é. Você ilumina.
O: - Momentaneamente.
A: - Pelo menos, ué! Tem gente que não tem mísero facho de luz.
O: - Você é vaga-lume.
A: - Eu não sou nada. Só sou boa.
O: - E nem tão boa assim você é.
A: - Ah não?
O: - Não, você é boa e tem poder, uma coisa rara, mas você também sabe ser má, se precisar. Se te magoam ou te decepcionam, você não consegue ser má?
A: - Não, se me magoam, eu só fico triste mesmo, tenho pouco escorpião no meu mapa, não curto vingança. Acho curioso a maldade pela vingança. Se me decepcionam, eu fico tão borocoxô, que tomar uma atitude vingativa me tomaria muito energia. E triste eu fico sem.
O: - Nunca te magoaram sério então, que bom. Porque tem uma hora que você se rebela.
A: - Não, tem uma hora que eu me escolho, eu me prefiro. Escolho minha sanidade, minha boa água no corpo. Não má água no corpo. Mágoa. Ó! Má-goa. Já tinha reparado?
O: - Ó!
A: - Você já viu Ligações Perigosas?
O: - Já, claro. 
A: - Tem uma cena que:




O: - É, o mundo muda pouco mesmo.
A: - Meus netos ainda vão ver notícias sobre conflitos no Oriente Médio.
O: - Notícias sobre o veranico no Arpoador em pleno inverno.
A: - Notícias sobre as escolas de samba falando sobre o café!
O: - Cenas finais de novelas com conflitos amorosos!
A: - Não sei porque filmam de novo, é tudo igual mesmo.
O: - Mas é triste quando ela fala que os que mais merecem amor não são felizes com ele.
A: - O amor é uma grande caldeirada incalculável.
O: - Faz parecer que a gente tem que cozinhar.
A: - Mas a gente tem. Alguns pratos demoram cinco horas para ficar bons, outros é só tssss, chapar mesmo. Não há garantias. Tem gente que passa dez anos num cozimento amoroso mas o prato pode nem ser tão bom quanto um tssss.
O: - Tsssss
A: - É importante saber o tempo do fogo.
O: - Eu não sei.
A: - Eu só sei que quem ama baixa a guarda. Sendo tão alta, fica difícil pra mim.
O: - En guarde?
A: - Touchée?

(Para de chover, nuvens se dissipam do céu rapidamente, parece desenho animado. De repente a lua, de repente as estrelas, de repente surge um homem tocando saxofone.)

O: - Se ele tocar Night and day, eu fico pelado e saio correndo pela praia.
A: - Se ele tocar Summertime, eu recolho suas roupas e te visto com calma e carinho.

Saxofone: - Eu amei-e-amei-ai-de-mim-muito-mais-do-que-devia amar
E-chorei-ao-sentir-que-iria-sofrer-e-me-desesperar
Foi-então-que-da-minha-infinita-tristeza-aconteceu-você
Encontrei-em-você-a-razão-de-viver-e-de-amar em paz
E-não-sofrer-mais-nunca mais 
Porque-o-amor-é-a-coisa-mais-triste-quando-se-desfaz
O-amor-é-a-coisa-mais-triste-quando-se-desfaz

(Ele resolveu ficar pelado mesmo assim, ela também resolveu recolher suas roupas. E por fim, vesti-lo. Com calma e carinho. Era a primeira promessa que cumpriam. Volta a chover.)





segunda-feira, 30 de setembro de 2013

sábado, 28 de setembro de 2013

terça-feira, 24 de setembro de 2013

...

eu poderia falar muita coisa, mas o vitor MATOU A PAU no texto dele no ornitorrinco.
PUTA MERDA, BRASIL.

http://www.ornitorrinco.net.br/2013/09/carta-de-amor-numero-1.html?spref=fb

enfim,

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

The

Nunca haviam se visto. Nem acreditavam nisso. Moravam na mesma cidade, mas nunca, nunca haviam se visto. 75 amigos em comum. Ok. Bom número, mas nunca tinham se cruzado. Você foi naquele show? Fui, mas não te vi. Você estava naquele aniversário naquela casa que deu polícia? Estava, mas não me lembro de você. Você ama esse restaurante? Mentira, eu também venho aqui quase toda semana. Lutavam contra a memória, na esperança de achar um fio condutor de coincidências do passado. Aquele mísero fio que desafia o acaso, e nos faz ficar quentes por dentro. "Sim, eu já tinha te visto". "Sim, eu lembro de você no show". "É, naquela festa eu te vi de longe e te desejei". Queriam isso. Desejavam isso. Mas não tinham. Eram inéditos na cidade que obriga passado. A cidade que exige coincidências como certificado humano de existência. Aqui no balneário você só é alguém se tiver estudado com fulano. Você só tem valor se conhecer sicrano. Nessa cidade existe uma suruba em delay, um pequeno "Barrados no Baile" cafona, curiosidade sexual pelo ex da amiga, tesão encalacrado pela mulher que o seu camarada está apaixonado. Passeiam pouco. Chocados com o não encontro, com a falta de memória, um pouco frustrados até, de repente um dia despertaram. Não tinham passado. Mas tinham presente. 

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

nobody else but you and me, baby

sóbrio, ele me analisa
alto, ele me ama
alto, ele me pergunta o que eu li de filosofia
sóbria, eu digo que só leio romance

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Eu durmo comigo - Angélica Freitas


eu durmo comigo/ deitada de bruços eu durmo comigo/ virada pra direita eu durmo comigo/ eu durmo comigo abraçada comigo/ não há noite tão longa em que não durma comigo/ como um trovador agarrado ao alaúde eu durmo comigo/ eu durmo comigo debaixo da noite estrelada/ eu durmo comigo enquanto os outros fazem aniversário/ eu durmo comigo às vezes de óculos/ e mesmo no escuro sei que estou dormindo comigo/ e quem quiser dormir comigo vai ter que dormir ao lado.




(Livro: Um útero é do tamanho de um punho/ Editora: Cosac Naify -2012)

sábado, 31 de agosto de 2013

Poema natural, de Adalgisa Nery



Abro os olhos, não vi nada
Fecho os olhos, já vi tudo.
O meu mundo é muito grande
E tudo que penso acontece.
Aquela nuvem lá em cima? 
Eu estou lá,
Ela sou eu.
Ontem com aquele calor
Eu subi, me condensei
E, se o calor aumentar, choverá e cairei.
Abro os olhos, vejo um mar,
Fecho os olhos e já sei.
Aquela alga boiando, à procura de uma pedra? 
Eu estou lá,
Ela sou eu.
Cansei do fundo do mar, subi, me desamparei.
Quando a maré baixar, na areia secarei,
Mais tarde em pó tomarei.
Abro os olhos novamente
E vejo a grande montanha,
Fecho os olhos e comento: 
Aquela pedra dormindo, parada dentro do tempo,
Recebendo sol e chuva, desmanchando-se ao vento?
Eu estou lá,
Ela sou eu

terça-feira, 27 de agosto de 2013

6

quando na praia
eu fico retardada
e esqueço que a idade dá forma ao corpo
e rolo
rolo da areia pra água
e da água prô céu





terça-feira, 20 de agosto de 2013

stalk me up

se eu analisar, são cruéis. mórbidos.
pouco audaciosos. desses que não passeiam.

vou te contar um segredo:
eu nunca colecionei álbuns pois nunca me foi concedido o delicioso azar provocante das figurinhas repetidas.

assim sendo, era muito fácil.
assim sendo, eu logo desisti.

gosto de passear, gosto do gosto do inédito.
enquanto eles repetem afeto-urubu-carniça, eu faço voos mais altos
em belo tapete,
desses que voam.

jamais conseguiria o que eles conseguem
e eles JAMAIS conseguiriam o que eu consigo.

não há vencedores.
mas pelo menos
para mim
há ineditismo.





um mundo todo novo
um novo fantástico ponto de vista




segunda-feira, 19 de agosto de 2013

first love

relato antigo, 2007, creio

Vou tentar. Começo: o menino mais bonito da sala era o Rodrigo Barbosa Santoro. Numa época de TV Pirata, ninguém o chamava de Rodrigo Santoro e sim de Barbooosa. Nos conhecemos com 3 anos, maternal, tia Concheta (sim, esse era o nome da minha primeira professora) e estudamos juntos no tal colégio de freiras até a quarta série. Eu era como ainda sou e serei pra sempre; a velhice vem, a essência é eterna: engraçada. Magrela, cabelo picotado, feito aquelas meninas judias de Auschwitz, umas orelhas de abano que não cabiam em mim, mas muito já serelepe e dada ao riso fácil. Rápida nas piadas, curiosa sobre a vida. Ah sim, também muito chata, reclamona, geniosa que só e metida à sabichona. Tínhamos sorteio das cadeiras, e como o destino me amava até então, sentei perto do Rodrigo durante muitos anos. E assim viramos comparsas. Eu, obviamente, muito apaixonada por ele. Ele, galã da sala, sorria para todas. Com 9 anos, nas férias de julho, o telefone da minha casa tocou, ao contrário de hoje em dia, antigamente eu adorava atender ao telefone, ser a primeira, chegava a disputar corrida com meu irmão para ser a primeira a dizer: “alô”. Vai entender, eu achava aquilo tão incrível, tecnologia sempre me impressiona. Então o telefone tocou, eu atendi, com uma voz taquarazinha que tive na infância e que graças aos hormônios, ficou mais grave com o passar do tempo. “Alô, Letícia? É o Rodrigo Barbosa!” A sala era empestada de Rodrigos e Fernandas, o que nos dava um tom nobre de só nos apresentarmos com nome e sobrenome. Isso, meus caros leitores, numa época em que ninguém se ligava. Eu até tinha anotado na minha agenda da Turma da Mônica, os números dos meus amigos. Mas era isso. Era só pra anotar. Ninguém se ligava e ficava horas no telefone. Você lembra dessa época? Oh, my. Ouvi a apresentação do meu adorado, senti a barriga de verme se contorcer e respondi veloz: “Oi Rodrigo, tudo bem?” pois era assim que via minha mãe fazer ao telefone. “Oi, fulano, tudo bem?” Eu tinha 9 anos e alguma noção de vida real. “Letícia, você quer namorar comigo?”, ele disse rápido e cruel. Senti alfinetes entrando no meu ouvido. E desliguei. Assim. Pá. Na cara dele. Fiquei muda, gaga, surda e monga. Passei o dia nervosa e xingando meus irmãos. Talvez tenha quebrado um copo. Talvez esteja inventando essa parte. Mas sempre quebrei copos, então deixa assim. Quebrei um copo. As férias de julho acabaram, e o primeiro dia de aula era mais assustador do que qualquer outro, pois haveria de olhar para Rodrigo Barbosa e dizer “Oi, tudo bem? Como foram suas férias?”. Quando eu entrei na sala, eu vi, eu não era boba, ele ficou sem graça. E eu, rainha de um deserto, com poder mas tão solitária, disse um “oi” coletivo e comecei a contar da viagem para o sítio, cavalos, joaninhas e lareiras. Em menos de uma semana, já éramos de novo, comparsas. Sempre perto, sempre rindo. Jogávamos bafo, minhas figurinhas eram do álbum da novela Vamp e de alguns atores galãs da época: Rob Lowe, Tom Cruise. Que coisa. Ele me deixava ganhar pois provavelmente não queria figurinhas de astros norte americanos. E também porque – cá entre todos – ele devia gostar de mim. Mas eu olhava pra ele, tão lindo e traumatizada pela magreza e pelas orelhas, refletia calada: “Não foi ele que me ligou e me pediu em namoro, não foi. Acorda, Letícia”. A quarta série veio e com ela, algumas meninas começavam a ter peito, e não só peito físico, mas também atitudes mais...hum... mocinhas? É. De repente pararam de falar de papéis de carta e começaram a falar do fulaninho de tal, da sexta série. Eu me assustei, pois o mundo do peito/atitude/mocinhas/meninos da sexta série já existia pra mim. Só que dentro. E ter que falar com a minha voz, dizer para todos, e assumir para mim mesma em voz alta que aquele mundo ia ser para o resto da minha vida, o meu mundo, foi muito difícil. Num dia qualquer, o telefone da minha casa tocou. Corri como sempre, bati o joelho na mesa, como sempre, atendi afobada e animada como sempre e “Alô, Letícia? É Rodrigo Barbosa!” Dessa vez só disse “Oi”, não consegui pronunciar “Tudo bem?” pois talvez tivesse medo de ouvir a verdade. Eu já disse que 8 entre 10 garotas gostavam dele? Pois. Oito entre dez meninotas babavam por ele. E não tinham vergonha de contar, de explanar. Eu, com a úlcera começando o processo de desenvolvimento, ouvia as gurias contando e nunca abri a boca pra dizer “ah, eu também gosto dele”, pois aquilo era pouco. Eu gostava dele sozinha e era muito.
Então após meu “oi” meio assustado, mais uma vez a pergunta precoce e assustadora: “Letícia, você quer namorar comigo?” E é porque sou repetitiva e é porque sempre fui muito medrosa que desliguei de novo. E fui direto para o banheiro observar minha mutação de cor. Eu era uma lagosta viva, dentro da rede de um pescador, se debatendo. O telefone tocou novamente, fui atender, e era o meu amor. Com uma voz que até hoje me aterroriza, Rodrigo Barbosa Santoro disse: “Não faz isso comigo não, Letícia”. Fato: estou toda arrepiada agora. Quantos quilos pesa essa frase? Eu posso carregar isso? A lenta morte da lagosta na água quente do pescador. Como a lagosta, lutei um pouco, e disse frases inéditas, coisas que nunca nem tinha pensado: “Mas e a Aline? E a Luciana? E a Claúdia?” E ali era meu desespero de não ser a única lagosta na panela. O pescador, com voz de agonia disse que gostava de mim “desde o maternal.”. Ou seja: há 7 anos gostava de mim, era apaixonado por mim, pensava em mim na hora de dormir, sonhava comigo acordado, queria sentar perto de mim, ver meus desenhos, estudar comigo, ser do meu grupo, sentar do meu lado no passeio do colégio. Como eu. Como eu. Como eu. Mas é também porque o amor sempre me foi clandestino mesmo antes de saber de tal palavra, que não tive forças nos meus braços, meus braços lagostianos, de me agarrar a ele. Desliguei o telefone de novo. “Não-faz-isso-comigo-não”. O que eu estava fazendo? A crueldade espontânea e sem querer que chegava a ele, era meu maior medo e minha grande excitação, enfim, então eu sabia que sim, que ele gostava de mim. De mim. Desde o maternal. Foi ali que minha sensibilidade extra terrena iniciou o bizarro e complexo caminho amoroso da minha vida. Lagosta livre, fui nadar, e com cuidado, para não me machucar. No dia seguinte, nasceu minha atriz. Estampei sorriso de “nada de muito diferente aconteceu ontem na minha vida de dez anos” e conversei com todos, muito simpática, inclusive com ele, que não tinha coragem de tocar no assunto ao vivo. O telefone nos defendia da exposição. Nós tínhamos dez anos, nenhuma experiência com o amor, mas muita vontade e muita coragem da parte dele, e muito medo, da minha. A quarta série acabou, e eu mudei de colégio. Numa época sem internet, raros telefonemas (a não ser para implorar pelo amor de 7 anos, ah), perdi contato com a maioria dos meus amigos. E assim foi a vida “não faz isso comigo não, Letícia” ou “não faz isso comigo não, VOCÊ”. Com 16 anos, estava na Sendas, fase meio mulamba, grunge, de macacão, ui, indo comprar sabe-se lá o quê. Tinha uma banca de jornal e revista dentro da Sendas. Prestes a decidir se eu levava uma de Palavras Cruzadas fácil ou média, ouço uma voz: “Letícia Novaes!!!”, uma mulher de uns 40 e poucos anos me olhava de um jeito muito carinhoso e um pouco assustador, já que eu não lembrava de onde ela era. Sorri de volta e esperei explicações. “Sou eu, fulana de tal, mãe do Rodrigo Barbosa, que estudou com você a infância toda.” A infância toda. A mãe do Rodrigo rindo tanto seis anos depois. Ela devia saber. Mãe sempre sabe. Abracei, falamos sobre a época do colégio e de repente ela solta: “O Rodrigo tá vindo pra cá, você já tá indo? Espera só um poquinho.” Gelei meus 16 anos. Rodrigo chegou rápido e muito, muito mais baixo do que eu. Demos um abraço denunciando nossa virgindade. O assunto foi leve e ingênuo: “e aquelas gincanas, e o dia que você caiu do skate e o dia que a gente cantou aquela música com o professor Hamilton". Rodrigo continua bonito, mas agora era outra beleza. Beleza dos homens que não alcançam meus olhos. Meu pau imaginário não sobe. Estudava não sei onde, queria não sei o quê de vestibular. Eu tive que ir, sempre tenho. Desassossego perde. Combinamos, à la carioca style, de marcar alguma coisa. Sim, sim. Abraço sem sentir nada, rainha do deserto, mas sem ser Priscila. Quieta que nem me reconheço. Volto pra casa, me olho no espelho e vejo: uma alface no meu dente. Sou nova, portanto a primeira reação é o constrangimento agudo de franzir os olhos e querer deslocar meu crânio de posição. Encontrei Rodrigo Barbosa depois de 6 anos e cá estava essa alface no meu dente. Desloca, crânio, desloca. Mas tenho uma macaca velha que mora dentro de mim desde sempre. Então, aos poucos, endureço pela tangente e metaforizo tudo. Meu primeiro amor foi desligado. Fiz alguma coisa que pediram pra não fazer mais. Meu primeiro amor existiu até vazar. Meu reencontro com o dito cujo foi constrangido e verde. Agora sou lagosta de aquário europeu. Fiquei com um problema sério: perdi as vergonhas. E tomei medo das ligações. Físicas e as cerebrais. Mas a gente vai levando. Só atende quem quer. E só desliga idem. Agora como alface, me como, me mastigo, lettuce in my mouth, com azeite e sal que é pra dar gosto nessa vida. Escovo os dentes, deito na rede, e sinto a delicada colite da digestão da lagosta frenética que um dia se apaixonou por um cavalo marinho distraído.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

situação


tô dormindo no lodo
da vala confortável onde dormem
os apaixonados
e lambendo sabão de cachorro
sorrindo, e sentindo cheiro de maçã
onde não tem
chamando os amigos pra almoçar
e deixando a comida esfriar
pra falar de você




da peste da bruna beber

segunda-feira, 22 de julho de 2013

queria fatia, mas veio trolha

lembrar sempre de sonho seria a tortura de ter duas vidas

quarta-feira, 10 de julho de 2013

1 de junho de 2009

achei agora sem querer, acho que ainda vale



Sonho derretido, desisto fácil. 
A megalomania das conquistas, não me chega: qualquer boda me constrange, seja a exemplo, fraterna ou a visualizada aos 7.
Um dia vou morrer calma de dor de cabeça. Vai vir pelo ouvido.
Me irrita o lugar de ninguém. A posse safada espacial.
Eu preciso ter filhos sorrindo e achar troca maior, mesmo que dure só os 5 anos iniciais. Afinal, afinal.
Estou bem torta em tentar a felicidade. Vergonha se me observam falando sozinha. Tirando melecas ao volante eu até gosto e ofereço pela janela suja que nunca foi minha. Talvez nunca nem consiga ter uma.
As coisas que valem são vestidos. Desses não muito caros que parecem.
Eu era uma torre, avançativa nas laterais, mas por agora equina, movimento-me reproduzindo letra alfabética que um dia me avisaram ser a "minha letra". 
Aceito. Eu tive que aceitar, não foi fuga das regras, ainda sangro todo mês, foi 
falta de força esquecer. 
Todas as realidades que me cabem, não as queridas.

A rainha desfila de qualquer maneira. Quando ela morre, ainda dá, só fica mais difícil chegar ao rei. Eu me cansei de ter medo do que mora em mim.